sexta-feira, 11 de novembro de 2011

PM contra o movimento estudantil

 
 
Sobre o caso da USP, isto é, a ocupação dos estudantes e a invasão da polícia no campus (e notem que usei “ocupar” para os alunos e “invadir” para os policiais, de modo que já declaro minha posição), escrevi um mote e, em seguida, meus amigos continuaram num interessante debate.
Replico a discussão para vocês. Mantive o anonimato das partes, já que pretendo dar destaque as idéias, sem causar exposição da figura de ninguém.
 
 
Mote
"Sou contra a ocupação dos alunos na reitoria". "Sou a favor da PM no campus". É tão fácil ter um posicionamento, e ser coerente com ele, quando não é você que vai a luta. É muito fácil para vc que é um alienado e nunca teve de se posicionar em outros assuntos além dos velhos temas: tradição, família e propriedade!
 
Debate
Envolvidos:
MA
TC
BM
DR
CN
Jiquilin

MA: O pior, Diego, é que nem coerência esse tipo de gente tem, sabe por quê? Porque eles são os primeiros a se inflarem em discursos contra a "repressão" quando jornalistazinho leva bala no morro fazendo matéria sensacionalista, reivindicando a "...liberdade de expressão". Mas não são capazes de perceberem a manipulação por trás da perseguição às poucas cabeças pensantes que ainda existem nesse país, o que é, isso sim, um grande ataque à democracia!

TC: A situação é simples: a lei é para todos e não vejo porque esses "únicos seres pensantes e isentos de alienação" da face da Terra devem ter tratamento diferenciado. Simples assim. Sem falar que a destruição que eles causaram será consertada com o meu dinheiro.

MA: Seu dinheiro?? Pode apostar que se não fosse por esses "únicos seres pensantes e isentos de alienação", o SEU dinheiro já teria ido todo pro ralo há tempos. Aliás, se existe preocupação com o uso do dinheiro público, que é de TODOS e não só seu, essa preocupação deveria estar voltada para o modo como esse dinheiro está sendo gasto em processos obscuros de financiamento de bolsas, em desvios para campanhas políticas, superfaturamentos, incentivos fiscais, obras faraônicas para o circo da Copa do Mundo (enquanto para a Educação só 4,5 do PIB)... e não com a "depredação" de prédios velhos já há muito depredados.. isso aí é ninharia perto do buraco negro pra onde o "SEU" dinheiro vai todos os dias, sem você perceber, porque pra isso não tem TV nem jornal nenhum pra mostrar!
E quanto à lei ser a única para todos... concordo plenamente... aliás, se vc não sabe, esses estudantes estão lá dedicando suas vidas, justamente para garantir a aplicação da lei maior, da nossa constituição, de que é para TODOS o direito à educação pública e de qualidade.

TC: Aham, volta lá no início e veja o que desencadeou essa revolta. Esse discursinho "damos a vida" pelo Brasil é tão antigo. Vocês sabem o que se passa na cabeça dessa gente. É um teatro baderneiro que encenam desde 1960 e nunca buscam métodos efetivos de mudança. Mas enfim, nunca pensaremos igual...

MA: Pois é... desde a década de 60... e se não fosse esses "baderneiros" sem métodos muito provavelmente ainda estaríamos vivendo sob aquele regime. Se vivemos em uma sociedade democrática hoje, deve ser porque os esforços iniciados nos anos 60 não eram tão sem métodos assim, não acha? E acho que os milhares que morreram torturados pelos representantes do governo, são provas de que o "dar a vida pelo país" não é um simples "discursinho" como vc coloca.
Agora se vc não acha que a democracia é uma conquista, também não deve achar importante a existência de uma Universidade pública, e consequentemente a luta por isso... aí nesse caso terei que concordar com vc.. nunca pensaremos igual mesmo.

TC: Detalhe, os baderneiros de 1960 são os caras que hoje vocês atacam e vão contra.

MA: Olha como vcs se contradizem o tempo todo, TC, se os caras da ditadura eram apenas baderneiros e "sem método", como podem estar no poder hoje mandando e desmandando no SEU dinheiro, hein?? O que acontece, meu caro, é que infelizmente, o poder e o dinheiro muitas vezes falam mais alto do que os ideais, mas isso não é argumento para desqualificar toda uma luta que é muito maior que exemplos individuais de militantes que "viraram a casaca".... Vcs falam que nós somos baderneiros e sem métodos efetivos de mudança, primeiro porque vcs nem sabem o que precisa ser mudado e segundo porque vcs não sabem trabalhar metodologicamente com IDEIAS. Se vcs conhecessem a força de uma ideia, saberiam que ela é muito maior do que a força de mil policiais. Por isso nós incomodamos tanto e só somos vencidos assim: com a mídia manipulando a pouca ideia de vcs!

BM: Acho que, se essa galera 'vira a casaca' é porque é muito mais fácil manter uma IDEIA de oposição e bagunça do que, efetivamente, fazer alguma coisa inteligente pra mudar. Nesse caso, posso considerar o VALOR DA IDEIA nulo.

TC: MA, alguns caras da época da ditadura deram origem ao movimento Diretas Já! e aí sim algo aconteceu. A ditadura não acabou porque um bando de revolucionário maconheiro invadiu gabinete ou escritório de nenhum General ou fez ato de similar impacto e/ou inteligência.

DR: Tem que ter PM dentro das prefeituras e dentro da Esplanada também. Lá eles não colocam policiais! É público também minha gente!

MA: BM, não existe ação sem ideia, seja ela boa ou má, o valor de uma ideia nunca é nulo. O que acontece é que algumas ideias são deturpadas pela mídia ou outros grupos mais poderosos. Além disso, vc(s) confunde(m) oposição com bagunça/baderna...... Sinceramente... num lugar tão grande como SP.. acho que se os jovens quisessem simplesmente fazer bagunça, eles teriam opções muito melhores do que a reitoria da USP, onde aliás eles correm o risco inclusive de serem jubilados... sinceramente... quem seria tão burro??

MA: Bom, TC, vc mesmo já deu um bom exemplo de como o movimento estudantil já contribuiu para construir um país diferente, apesar de ter menosprezado o papel dos estudantes nessa história. E se vc pesquisar um pouquinho vai ver que esses mesmos estudantes também foram tachados de coisas piores até do que de maconheiros.. aliás não só estudantes, qualquer militante de esquerda era considerado "comunista comedor de criancinha" e até hoje tem gente que pensa assim... Fazer o quê?.. Quem se instrui um pouco mais sabe que não é bem assim. Acho que ao invés de comprar o discurso da mídia, vc podia se informar um pouco melhor sobre o movimento de greve das universidades estaduais que começou muito antes dessa história da invasão da PM ao campus (sim, se houve alguma invasão foi a da PM), para depois sair por aí tachando os estudantes de "baderneiros" e "maconheiros"... sinceramente, isso é sinônimo de ignorância pura....

TC: Vocês que sofrem de esquerdopatia tem a mania de achar que qualquer opinião diferente da de vocês é ignorância, falta de informação, cabeça manipulada pela mídia etc etc etc. Seja um pouco mais humilde e debata sem subir no pedestal de único ser pensante do assunto. Apesar de você ter opinião contrária a minha, não te considero alienada, burra, desinformada. Aprenda a respeitar a diversidade de opiniões e pensamentos.

MA: Respeito demais a diversidade, e mais ainda, adoro encontrar pessoas que me façam repensar e rever minhas opiniões. Te garanto que não sofro de "esquerdopatia", embora entendo do que vc está falando. É que tem certas opiniões, TC, que não tem como deixar de notar que é produto da manipulação da mídia sim. E essa história de estudante baderneiro é uma delas. Se você conseguir provar para mim que os estudantes invadiram a reitoria da USP em busca do direito de serem maconheiros, eu humildemente tirarei o meu chapéu pra vc e saio da discussão. O fato é que a polícia não estava lá apenas para garantir a ordem e o cumprimento da lei. Se fosse um movimento anti drogas, porque eles não foram lá no centro onde os viciados não deixam nem o trânsito fluir de tanto que dominaram o local? Se a PM fosse um exeeeemplo de eficiência, se o crime já tivesse totalmente controlado em outros pontos da cidade e a polícia não tivesse nada pra fazer.. tudo bem ir lá na UNIVERSIDADE prender uns maconheirinhos... mas pera lá, né?... não tá nem perto de ser o caso... Não te considero nem alienado nem burro, se não nem me daria o trabalho de continuar essa discussão, agora.. que vc no mínimo está um pouco desinformado.. isso com certeza.. se não ao invés de mudar de assunto jogando a culpa na minha "esquerdopatia" vc tinha me apresentando alguma informação que me fizesse calar a boca!
 
TC: Eu concordo quando você compara a atuação da polícia na USP e em outros ponto violentos da cidade, e também acho um absurdo a falta de coerência de atitudes. Por outro lado, não podemos usar esse argumento para justificar certas atitudes. Se fosse assim, viveríamos numa anarquia, já que no Brasil todos se sentiriam no direito de roubar, usar drogas, contrabandear etc, se sentindo no direito de fazer como uma parcela da população que faz e não é punida. Mas isso seria correto? Outra coisa, se esses alunos lutam pela democracia, por que não seguiram a vontade da maioria dos alunos da USP (vai ver porque se acham os únicos seres pensantes da face da Terra)? Por que a grande maioria dos alunos da USP estão contra eles? Por que são alienadinhos no conceito de vocês ou por que vivem lá o dia todo e sabem o que se passa naquela universidade? Ontem os professores da USP decidiram não aderir àquela greve de alunos, estranho isso, não? Aluno faz greve e professor não? Que mundo transcendental é esse que vive o grupo seletos dos pensantes da USP?

CN: Não acho bem isso... Eu tenho as minhas razões pra ter minhas opiniões. Eu pesquisei, li várias coisas a respeito, conversei com conhecidos que estudam lá. E permaneço contra a ocupação porque eu sei que entre os manifestantes existem os "massa de manobra" que estão lá por auê (veja que não estou dizendo que são todos ou a maioria) Sei, porque eu já estudei na fflch e sei que lá existe gente que está na faculdade pra fazer politicagem, depois de cumprir sua missão na USP vai pra outra universidade, e assim vai indo! Sim sim sim, eles existem.
Ao mesmo tempo, não sou contra a presença da PM no campus SE ela agir de acordo como deve agir, e não como quer agir ou como um superior quer que ela aja.
Pronto, opinião justificada.

Jiquilin: CN, como a MA, já disse, esses são casos particulares que não devem deslegitimar toda uma luta muito MAIOR que massas de manobra. Sugiro que vc leia toda a discussão, está muito interessante. Do mesmo modo, eu ainda continuo opinando que "pensar sobre" não é a mesma coisa que "pensar com". A gente não tá lá, não sofre perseguição política, não levantamos a bunda por nada (somos uma geração que aprendeu só a nascer e a morrer, porque crescemos, segundo dizem, num ambiente preocupado com a segurança - do negro ao mulçumano-, com medo da Aids etc etc). Só podemos nos solidarizar com a classe, muito embora possamos não concordar com seus métodos. Isso, no entanto, não significa que somos seres privilegiados, porque somos os únicos pensantes, obviamente esse argumento é patético. Como a MA tb já disse, defendemos que todos devem pensar e isso só é possível numa sociedade cada vez mais democrática, com uma educação pública e de qualidade.



MA: Vejo que a discussão está cada vez mais interessante.. Começando pelo último comentário do TC, gostaria de lembraá-lo e a todos, que os estudantes do Movimento Estudantil de qualquer universidade, inclusive o da USP, são representantes eleitos democraticamente através de votações legítimas, então é inaceitável falar em falta de democracia, ou que eles representam uma minoria. Se eles representam uma minoria, é porque a "maioria" se absteve de participar dos espaços destinados para as tomadas de decisões, como as assembléias estudantis, formação de chapas, etc. No "dia-a-dia" do campus, como o TC diz, poucos se atentam para a importância desses espaços e quando algo grande acontece, como a invasão da PM, muitos desses que passam seus dias preocupados apenas com os "SEUS" afazeres, usam da internet para dizer coisas que deveriam dizer ao longo da vida acadêmica, nos espaços legítimos criados para essas discussões. Então, TC, se os estudantes que ocuparam a reitoria não atendem a vontade da maioria, não é por falta de democracia, nem muito menos por se acharam mais pensantes ou mais inteligentes do que essa suposta "maioria", mas sim (SUPONDO que de fato exista essa maioria que discorda dos últimos atos dos estudantes) porque essa maioria não se fez ouvir e não esteve presente nas assembléias que deliberaram sobre o assunto.

Agora, sobre a parte moralista do seu comentário, como vc mesmo apontou, há uma grande incoerência na atitude da polícia, e o fato de destacarmos essa incoerência não significa que queremos "justificar certas atitudes", muito pelo contrário. Mostrar o exagero da polícia é mostrar justamente quem são os verdadeiros bandidos dessa história, a saber, a corja de tucanos que quer destruir tudo que é público. Se os bandidos fossem simplesmente um bando de deliquentes juvenis, não haveria motivo algum para abalar metade do efetivo da PM, para combatê-los. Meia duzia de viaturas e um bom comandante já resolveria o problema da "baderna". Veja bem, ontem mesmo precisei ligar no 190 e não atenderam a ligação depois de várias tentativas! Depois me explicaram que eles não tem culpa, que a demanda é grande para poucos atendentes, as viaturas demoram a chegar porque é coisa de 1 viatura para 60 mil habiltantes... e por aí vai... Então quando eu disse que vcs não sabem o que significa aquele verdadeiro arsenal militar dentro de uma universidade pública.. é porque vcs não sabem mesmo, e eu não to falando isso tipo "me achando A cabeça pensante". É como o Jiquilin disse, nada como estar DENTRO de uma realidade para compreendê-la com mais propriedade. E no final é isso o que acontece: os estudantes que estão lá ocupando a reitoria, votando em greve, etc, são estudantes que dedicam boa parte de suas vidas na luta pela universidade pública, gratuita e de qualidade. E só quem está nessa luta conhece bem as manobras do governo para tirar o mérito de quem está lutando. Então, TC, quando dizemos que julgar os estudantes do movimento de "maconheiros deliquentes" é alienação, não é porque sofremos de "esquerdopatia", mas sim porque reconhecemos nesse discurso a eficiência da manobra do governo para tirar o foco daquilo que é realmente importante: o sucateamento da educação pública em todos os níveis de ensino.